Lei Maria da Penha completa 11 anos
A Lei nº 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha, completa 11 anos de vigência nesta segunda-feira (7) e é uma das três mais avançadas do mundo em relação à proteção da mulher. Mais de 90% dos brasileiros conhecem a norma, ainda que de ouvir falar.
A notícia ruim é que o Brasil foi o 18º país da américa latina a ter uma lei de proteção integral à mulher e isso significa que demorou muito, já que o país é o quinto onde mais se mata mulheres. Porém, nem sempre quem sofre a violência denuncia quem a pratica e é fato que quem mais mata são os ex-maridos, os ex-namorados e ex-companheiros. Destaque-se que as mulheres sofrem violências mais graves quando propõem o final do relacionamento
Qual a razão de as mulheres sofrerem violência caladas? Uma pesquisa realizada pelo DataSenado perguntou às vítimas os motivos pelos quais as mulheres não denunciam seus agressores. O resultado mostra que 24% apontam a preocupação com a criação dos filhos; 21% têm medo de vingança do agressor, 16% acreditam que sofreram violência pela última vez, 10% acreditam que não existe punição para o agressor, 7% têm vergonha da agressão e 16% escolheram outra opção.
Diante dessa realidade, atuar em áreas que combatem a violência contra a mulher – seja física, psicológica, financeira, emocional, enfim, em qualquer uma das mais diferentes formas – parece um trabalho inglório, inútil, como enxugar gelo.
Contudo, a juíza Jacqueline Machado, que responde pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar e é titular da 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Capital, a primeira Vara de Medidas Protetivas do Brasil, acredita na norma e em sua eficácia.
Jacqueline entendo que essa é uma lei inovadora que permitiu a magistrados uma proteção mais eficaz para as mulheres vítimas de violência, o que antes da lei era quase impensável.
“A inexistência de mecanismos de proteção antes da Lei Maria da Penha fazia com que muitas mulheres sequer denunciassem a violência sofrida, já que quase sempre esse tipo de violência acontece longe dos olhos alheios, o que dificulta a prova. Isso se modificou com a lei e a suas interpretações jurisprudenciais, pois atualmente a palavra da vítima tem especial consideração”, afirmou.
Infelizmente no Brasil ainda impera a cultura do machismo, então, como a juíza vê o avanço trazido pela Lei Maria da Penha? Ela responde que a norma é considerada pelas Nações Unidas como uma das melhores leis para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher.
“Essa não é apenas uma lei essencialmente penal, já que dispõe de uma integralidade de ações e políticas públicas para a prevenção e combate da violência contra a mulher. Isso é importantíssimo e demonstra a importância da lei, pois é óbvio que nenhuma lei penal, por si só, é capaz de alterar uma cultura milenar de desigualdade e discriminação contra as mulheres, causas estruturantes das diversas formas de violências que nos atingem cotidianamente”, opina.
A pesquisa da DataSenado mostra que nem sempre a mulher denuncia a violência sofrida. Será que a vítima tem consciência da proteção oferecida pela Lei Maria da Penha? Jacqueline cita a última pesquisa DataFolha, divulgada em 08 de março de 2017. “A violência doméstica e familiar contra a mulher ainda tem alta taxa de notificação. 52% das mulheres entrevistadas não denunciaram a violência sofrida e isso se deve também ao desconhecimento dos mecanismos de proteção existentes na lei, entre outras causas ligadas ao medo, preocupação com filhos e familiares, existência do ciclo da violência, dependência emocional e eventualmente financeira”.
Questionada sobre se a mulher usa efetivamente os dispositivos dessa lei que a protegem, Jacqueline aponta que esse é um tema complexo, pois, ante a existência de vínculos entre o agressor e a vítima, apesar de solicitar medida de proteção de afastamento e proibição de aproximação e contato, muitas vezes, esta acaba se descuidando da medida de proteção e deixando o autor da violência se reaproximar.
“E a reaproximação acontece sob inúmeros pretextos como, por exemplo, a visitação aos filhos comuns ou ainda demoram para comunicar o descumprimento da medida de proteção. Tal comportamento enfraquece o poder de proteção da medida, fazendo com que a violência se repita”, ressalta.
Apesar de tudo, muito se avançou no que se refere à violência contra a mulher em suas mais variadas formas. Será que a juíza acredita que isso seria possível sem a Lei Maria da Penha? “Entendo que a Lei Maria da Penha é uma grande referência para a consolidação de políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres no Brasil e podemos dizer que avançamos nesses 11 anos, o que não seria possível sem a força dessa lei”.
Será que falta algum item nessa lei e o que poderia ser melhorado na norma? “O que falta é a execução de tudo o que está previsto na Lei Maria da Penha, ou seja, colocar em prática, de forma mais eficaz, medidas de prevenção, assistência e promoção dos direitos das mulheres. Além disso, precisamos avançar na legislação a fim de tipificar todas as condutas que configuram a violência psicológica prevista na referida lei”.