Ministro Luis Roberto Barroso fala sobre 30 anos da Constituição Cidadã
O ministro Luis Roberto Barroso, um dos maiores expoentes jurídicos do Brasil, integrante do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), esteve em Campo Grande para uma palestra a magistrados e servidores do Poder Judiciário, na noite desta segunda-feira (17).
Atendendo convite do Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso, diretor-geral da Escola Judicial (Ejud/MS), o ministro deixou os presentes extasiados com sua fala ao abordar os 30 anos da Carta Magna, chamada de Constituição Cidadã. O presidente da AMAMSUL, juiz Eduardo Eugenio Siravegna Jr., cumprimentou o desembargador pela iniciativa e ressaltou a importância da presença de um ministro da mais alta Corte de justiça em Mato Grosso do Sul.
“Com muita sensibilidade, o Des. Júlio trouxe essa personalidade jurídica para nos trazer tantas informações importantes. A magistratura, tão duramente atacada, regozija-se nas palavras do ministro Barroso, homem culto, de extrema elegância no trato com a classe e conhecedor profundo da Constituição Federal. A escolha não poderia ser melhor”, disse ele.
Muito à vontade e elogiando a Capital sul-mato-grossense, Barroso afirmou que o Brasil vive um momento difícil e que um conjunto de circunstâncias adversas criaram o que convencionalmente se passou a denominar tempestade perfeita: uma tempestade política, econômica, ética.
“Na verdade, vemos a soma de muitas coisas ruins, que já duram há muito tempo: trauma de impeachment, recessão prolongada, queda na renda, um largo período de desemprego (talvez o maior da nossa história). Tudo abalou, de certa forma, a autoestima da sociedade brasileira, de forma geral. E de fato é impossível negar que a fotografia do momento é muito ruim, porém, apesar disso, o filme da democracia brasileira, desses 30 anos de democracia no país, é um filme bom. Com alguns ajustes pode nos levar a um final feliz”, afirmou.
No entender do ministro, os países e as pessoas passam pelo que têm que passar para se aprimorarem e essa é uma transição necessária, que o Brasil precisava atravessar. “Ao final desse processo histórico difícil e sofrido, teremos nos saído como um país melhor e maior, sobretudo, conseguiremos elevar a ética pública e privada do país. E este é um passo decisivo para rompermos o cerco e nos tornarmos verdadeiramente desenvolvidos: um país que fure o cerco da renda média e consiga oferecer uma vida digna para todos os cidadãos”.
Em uma fala que prendeu a atenção dos convidados, Barroso dividiu sua palestra em três partes. Na primeira, ele documentou e apontou os avanços nos últimos 30 anos, citando a estabilidade institucional, estabilidade monetária, responsabilidade fiscal, inclusão social. “Em 30 anos, conseguimos tirar entre 30 e 40 milhões de pessoas da linha da pobreza extrema. Poucos países conseguiram tirar tanta gente da miséria em um intervalo tão relativamente curto. Nos últimos 30 anos, o Brasil teve o maior crescimento percentual no índice de desenvolvimento humano da América Latina”.
O segundo ponto destacado por Barroso foi o olhar para o Brasil atual, com um diagnóstico do que não andou bem nas três últimas décadas, destacando alguns pontos negativos: o sistema político brasileiro, uma agenda inacabada que precisa ser retomada com urgência; a transformação do Brasil em um dos mais violentos do mundo, e a corrupção estrutural e sistêmica, que devastou o país.
“A corrupção não é fenômeno de um governo, de uma pessoa ou um partido. É um processo cumulativo, que vem de longe, e transbordou na nossa geração, nos dias de hoje. A corrupção existente no Brasil não é produto de pequenas fraquezas humanas ou falhas individuais localizadas. É produto de esquemas profissionais, de arrecadação, desvio e distribuição de dinheiros públicos. Esquemas que envolveram empresas privadas e estatais, partidos políticos, agentes públicos e privados, enfim, é espantoso o nível de contágio da corrupção no Brasil. Há uma imensa demanda no país pela ética, idealismo e por patriotismo. Essa é a energia que muda paradigmas”, explicou.
Antes de iniciar o terceiro ponto, o ministro fez um parêntese: na troca de governo Dilma/Temer, o grande debate era quem seria o ministro da Fazenda. Compreensível, já que o Brasil entrava em uma recessão, porém, ninguém discutiu quem seria o ministro da educação nem quais as grandes ideias. “A educação entrou no racha geral da política. O que quero dizer é que não tratamos a educação como verdadeiramente uma prioridade. (...) Os problemas da educação brasileira são a não alfabetização das crianças na idade certa, evasão escolar no ensino médio, déficit de aprendizagem, necessidade de capacitação de professores. Foram cinco ministros nos últimos quatro anos e meio e não há política pública que resista a essa descontinuação”.
Para fechar a noite, ele apontou algumas das muitas realizações conquistadas nos 30 anos. “Temos reformas estruturais profundas que ainda precisamos fazer. O sistema político, o papel do Estado no enfrentamento da corrupção. O Judiciário viveu uma ascensão institucional muito importante, tem quadro muito qualificado, contudo, ainda presta um serviço de pouca efetividade à sociedade brasileira – vamos ter que colocar na agenda a melhoria no funcionamento do Judiciário”, afirmou
Para o ministro Barroso, essa tempestade política, econômica e ética que o país está vivendo, é que oferece uma conjuntura crítica em que talvez, em se sabendo aproveitar o momento, será possível construir instituições econômicas e políticas inclusivas – com livre inciativa, justiça social, participação das pessoas, probidade na gestão da coisa pública.
“E a minha confiança em que esse dia chegará é porque temos uma sociedade que despertou. Ela já tem indignação, já tem os diagnósticos e precisamos fazer o melhor: não desistir no meio do caminhos e nem nos deixar hipnotizar pelos maus exemplos. A pior coisa de um mal exemplo é ser seguido – e tem muitos maus exemplos no Brasil. Porém, o pior que pode acontecer é os bons desistirem de serem bons para seguir os maus exemplos. Não importa o que esteja a sua volta, faça o melhor papel que puder. E assim faremos um novo país. Muito obrigado”.
Antes de receber os cumprimentos dos presentes, o ministro Luis Roberto Barroso recebeu dos deputados Paula Correa e Beto Pereira a Medalha ao Mérito Legislativo.
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